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Uso da Acupuntura em fístula perianal: Estudo de caso

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Baseado no TCC das alunas Ana Paula J. Colobiale e Viviane C. Arruda, para conclusão do curso de pós- graduação em Acupuntura do CETN Campinas.

O objetivo deste estudo de caso foi entender a relevância da utilização de pontos de acupuntura em casos de fístulas perianais e sua importância na organização da energia do paciente, colaborando para evitar complicações associadas ao quadro, bem como, contribuir para novas pesquisas e tratamentos por meio dessa técnica. O aparecimento da fístula perianal causa piora na qualidade de vida do indivíduo.

Esta fístula é um trajeto anormal entre o canal anal e a superfície corporal na região perianal. Pode ser um trajeto único entre as duas aberturas ou trajetos secundários, mais ou menos complexos, com origem na mesma abertura no canal anal e com aberturas secundárias múltiplas.  Frequentemente são consequentes à infecção de glândulas presentes na parede do canal anal, junto aos esfíncteres anais, com posterior acúmulo de secreção purulenta (abscesso anal). Se obstruídos, os canais de drenagem das glândulas, há um processo inflamatório que induz a formação de um trajeto fistuloso, em direção à superfície corporal, através da qual será drenado o conteúdo. Caso esta abertura cicatrize, ocorre uma nova acumulação de pus no trajeto da fístula, e o processo repete-se. Podem também desenvolver fístulas anais secundariamente a traumatismos periretais ou anais, fissuras anais, doença de Crohn, diverticulite, doenças anoretais malignas, tuberculose e outras doenças infecciosas. 

Seu diagnóstico é feito com base na história clínica, nos sintomas presentes e no exame físico da região perianal, que pode revelar uma área endurecida, avermelhada e dolorosa. Normalmente observa-se um abcesso ou a abertura da fístula com a presença de corrimento através desta. Poderão ser necessários outros exames, como anuscopia, fistulografia, ecografia endoanal, ressonância magnética, sigmoidoscopia flexível ou colonoscopia. O tratamento da fístula perianal inclui o tratamento da infeção que possa estar presente e a resolução cirúrgica da fístula. Com efeito, dado que as fístulas não cicatrizam espontaneamente, o seu tratamento cirúrgico é imprescindível. O tipo de abordagem cirúrgica a adotar depende das especificidades do caso, incluindo a localização e complexidade da fístula, bem como o seu grau de interferência com o esfíncter anal.

Segundo a literatura da MTC, as doenças ulceradas da pele com secreção purulenta e os abscessos são relacionados à Umidade. Após avaliação diagnóstica segundo a MTC, foram diagnosticadas no paciente deste estudo: Deficiência do Yin do Rim e Deficiência do Qi do Baço com Umidade. 

O Baço rege a transformação e o transporte. Após o Estômago decompor e digerir o alimento, o Baço transforma-o em nutrição utilizável e em Qi, e transporta essa essência do alimento para os outros Órgãos. Desempenha papel na produção de sangue. Por essa razão, a fadiga (deficiência de Qi) e a anemia (deficiência de sangue) são atribuídas à incapacidade do baço de transformar alimento em Qi e sangue. Além de seu papel na nutrição e produção de sangue, o Baço também auxilia o corpo a se livrar da Umidade (fluídos excessivos retidos) e a umidificar as áreas necessárias, como as articulações. Se essa função é prejudicada, as desordens ligadas aos fluídos, como edemas ou fleuma excessiva (severa retenção líquida), podem se desenvolver. Essa Umidade pode ser por retenção de líquido comum, gordura localizada, linfa não circulante e até mesmo o sangue fora dos vasos. Todo fluído que não é utilizado pelo corpo transforma-se em umidade interna, podendo levar à formação de fleuma, que é um líquido mais viscoso e mais difícil de ser drenado. A principal causa para formação da fleuma é a deficiência do Baço quando falha ao transformar e transportar os fluidos corpóreos. Entretanto, o Pulmão e o Rim também estão envolvidos na formação da fleuma: se o Pulmão falha ao dispersar e descender os fluidos e se o Rim fracassa ao transformá-los e excretá-los, eles poderão se acumular e se transformar em fleuma. A Umidade perversa é de natureza Yin, pois se caracteriza por ser molhada, pesada e lenta. Está relacionada a manifestações externas, como doenças de pele, ulcerações e abcessos (sempre com presença de pus), urina turva, diarréia e leucorréia com muito pus e odor repugnante.

O Rim é frequentemente referido como a “Raiz da Vida” ou “Raiz do Qi Pré-Celestial”, porque ele armazena a essência que, em sua forma pré-celestial, é derivada dos pais e estabelecida na concepção; tal essência determina nossa constituição básica. A essência do Rim proporciona a base material tanto para o Yin como para o Yang do Rim. O calor por deficiência, originado da deficiência do Yin do Rim, pode subir para perturbar o Coração e, portanto, a Mente, ocorre insônia e inquietude mental. Isso é descrito, em Chinês, como “O Coração sente-se impaciente”, e descreve um estado de inquietação, intranquilidade e ansiedade indefiníveis, mas muito reais e afligindo o paciente. A insônia é facilmente caracterizada por adormecer, mas acordar no meio da noite, várias vezes, ou despertar muito cedo. Nos conceitos clássicos, da MTC, Yin e Yang representam opostos complementares, de modo que o Yin está associado com frio, quietude, escuridão, repouso, noite, sono, enquanto o Yang está associado a calor, movimento, claridade, atividade, dia, vigília. Assim, é possível perceber a relação da insônia, segundo a MTC, com uma falta relativa de Yin, ou seja, uma falta de repouso, noite, sono.

ANAMNESE: Sexo masculino, 38 anos, casado, apresenta fístula perianal, lombalgia, colesterol alto e congestão nasal por desvio de septo. Refere sensação de muito calor em todo o corpo, intensa transpiração acordando extremamente suado e muita sede. Queixa-se de dor de cabeça em região frontal. Evacua diariamente, uma vez ao dia, fezes pastosas e urina amarela clara. Relata agitação noturna, com sono de má qualidade, às vezes acorda e não consegue dormir. Refere normalidade na vida emocional, porém sofreu perda de familiar há dois anos, com dificuldade para falar sobre o assunto. Nega queixas auditivas e do aparelho genito-urinário. Língua vermelha, descamada, alargada, com marcas dentárias e saburra fina. Pulso rápido e vazio.

Realizou seis cirurgias (drenagens perianais e fistulectomias com colocação de fio de seda e posterior retirada do mesmo) e faz uso das seguintes medicações: Rusovas (5mg), Zetia (10mg) e vitaminas (esporadicamente).

Diagnóstico Energético: Oito critérios: Exterior e interior; deficiência; YIN; calor vazio.

Síndromes das substâncias fundamentais: Deficiência de Qi, Estagnação de Qi, Distúrbio do Shen.

Com base na avaliação do paciente, com a palpação dos pulsos apresentando sinais de deficiência e as características da língua correspondendo à deficiência de baço e presença de umidade, levantou-se a hipótese diagnóstica na perspectiva da MTC, de que a fístula perianal ocorre por umidade pela deficiência do baço. Os elementos Terra e Água são propensos a terem síndromes de deficiência, é possível fazer uma relação de que a preocupação excessiva pela perda familiar acarretou a deficiência da Terra afetando a Água, que já estava debilitada por fundo emocional (medo).

Síndrome do Zang Fu: Deficiência do Qi do Baço, deficiência do YIN do Rim e Umidade.

Diagnóstico energético: Deficiência da Terra afetando a Água.

Proposta terapêutica: Tonificar o Baço, tonificar Yin do Rim, mover o Qi estagnado, resolver a umidade, acalmar o Shen. Orientar a alterar hábitos alimentares, como: evitar ingesta de lacticínios e açúcar, optar por alimentos que nascem embaixo da terra e alimentos amarelos e alaranjados.

Foram realizadas dez sessões de acupuntura, uma vez por semana, com vinte minutos de duração, utilizando os pontos R3, BP9, E40, BP3. Nas primeiras cinco semanas também foi submetido a sessões de auriculoterapia chinesa, uma vez por semana, nos pontos auriculares Shen Men, Rim, Baço, Ponto da Neurastenia, Coração, Lombar e Ânus. Os pontos foram selecionados de acordo com sua ação energética, visando os mais indicados no tratamento das síndromes diagnosticadas e sintomas apresentados pelo paciente.  Para a aplicação da técnica, foi realizada a assepsia local com algodão embebido em álcool 70% e as agulhas de acupuntura foram inseridas bilateralmente e perpendiculares à pele nos pontos: 

Na auriculoterapia chinesa foi realizada assepsia do pavilhão auricular com algodão embebido em álcool 70% e colocação de sementes de mostarda nos pontos auriculares referidos, aderidas com fita adesiva. Foi solicitado ao paciente que estimulasse os pontos três vezes ao dia. Os pontos utilizados foram: 

Os resultados foram avaliados e comparados, através de uma reavaliação no término do tratamento e com a evolução ao longo das sessões demonstrou níveis significativos de melhora.

Primeira sessão, paciente foi colaborativo, sendo realizada avaliação geral para diagnóstico energético. Iniciado tratamento através dos pontos de acupuntura sistêmica e auricular. No dia seguinte, paciente referiu sangramento anal, o que foi algo positivo notado pelo seu cirurgião, que afirmou estar ocorrendo a formação de tecidos de granulação e haver oxigênio na região da fístula.

Segunda sessão, referiu pouca melhora dos sintomas, ainda apresentando excreção de secreção purulenta em abundância.

Terceira sessão, as noites de sono breves com sono diurno excessivo, estavam mais estáveis.

Quarta sessão, referiu melhora do sono, com menos ansiedade e acordando mais disposto.

Quinta sessão, apresentou melhora geral dos sintomas, inclusive a dor lombar.

Sexta sessão, referiu ter consultado o médico, e de acordo com o exame clínico, a cicatrização estava bem melhor.

Sétima sessão, havia realizado procedimento cirúrgico para retirada do fio de seda que drenava a secreção purulenta e relatava felicidade com a notícia da cura. Somente apresentava um pouco de enjoo, provavelmente pelas medicações pós-cirúrgicas.

Oitava sessão, apresentou diminuição gradual dos sintomas pós-cirúrgicos, retornou ao trabalho e estava disposto.

Nona sessão, referiu discreta dor no local do procedimento cirúrgico. 

Décima sessão, apresentou melhora da dor e referiu estar se esforçando para melhorar hábitos alimentares e iniciar atividade física.

Conforme os objetivos deste estudo, baseando-se nos resultados encontrados, houve melhora gradual da secreção purulenta da fístula perianal; alto grau de melhora relacionado à ansiedade e qualidade de sono.

O paciente também modificou seu estilo de vida, com a adoção da prática regular de exercício físico e a redução significativa do consumo de leite e derivados, e foi essencial para os resultados obtidos uma vez que não foram tratados apenas os sintomas relatados, mas sim a causa da desarmonia.

Conclui-se que a acupuntura apresentou significativos resultados, apresentando sua eficácia e melhora na qualidade de vida do paciente.

Autor do artigo: Carla Ceppo

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